terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

Um Sábado, Um Jogo

Por Denis Quattrone

O sábado era ensolarado e já eram 29 dias do mês de Agosto de 2009. O sol castigava quem se atrevia a ficar sem boné na rua. As pessoas iam para o conforto do ar-condicionado de um shopping qualquer, ou se refrescavam em quiosques de suco natural. São Paulo fervia em plena tarde de inverno.


Um jornal esportivo noticiava um jogo de futebol numa terra distante... Milan e Internazionale duelariam no chamado Derby della Madonnina, mais conhecido como o “clássico da cidade de Milão”. O palco da disputa seria o estádio Giuseppe Meazza, que fica no bairro de San Siro. Um pouco mais abaixo desta notícia, aparecia uma pequena nota: “Javari: Moleque Travesso encara São Bernardo”.

Como seria um pouco difícil chegar a Milão naquela mesma tarde, a manchete do time da rua Javari me despertou a atenção. Esse Moleque Travesso, que tanto ouvi falar jogaria naquela mesma tarde de um clássico italiano. Era o clássico milanês, a televisão e o ventilador na potência máxima ou o Moleque Travesso e o calor.

Convidei meu pai, grande conhecedor das ruas da Mooca, bairro tradicional italiano de São Paulo. Chegamos em cima da hora, já haviam cantado o Hino Nacional e a bola rolava no gramado do estádio Conde Rodolfo Crespi. Havia uma grande arquibancada coberta onde torcedores com camisas do Milan, da Inter e de outros clubes europeus se escondiam do sol, o jogo apresentava boa velocidade apesar do calor daquela tarde. O Juventus marcou logo no início e assim permaneceu o placar no primeiro tempo.

No intervalo do jogo, apareciam torcedores com doces envoltos num guardanapo, que fiquei conhecendo como canoli juventino, algo como um canelone folhado recheado com creme. Maravilha de doce. Na fila do canoli, fiquei sabendo que o Juventus teve apenas uma derrota neste campeonato justamente para o São Bernardo, no campo deles, pelo placar de 3 a 0.

O segundo tempo já começava quando retornei para o lugar ao lado de meu pai na arquibancada. O São Bernardo criava mais e apresentava maior volume de jogo. Não seria um jogo fácil. Dava a impressão que o estádio estava mais cheio na etapa final, sentou um senhor do nosso lado, que mais ficava de pé xingando o bandeirinha. Boa parte dos palavrões disparados por ele era em italiano e provavelmente de algum dialeto do sul da “Bota”. Não fosse uma veia saltada no pescoço deste senhor a cada esbravejo e o bandeirinha não saberia se estava sendo xingado ou elogiado. O jogo começava a tomar proporções gigantescas, nem tanto dentro de campo, mas nas arquibancadas a vitória por 1 a 0 não tinha tanto significado. A torcida juventina queria mais dois gols. Vamos devolver a goleada!!! – gritou outro senhor logo acima, que me lembrou Corleone, tanto pela semelhança como pelo temperamento. Enquanto enxugava os respingos de saliva de Don Vito da minha cabeça, o Juventus fazia o segundo gol, e o time inteiro de São Bernardo e sua pequena torcida reclamavam alguma coisa com o juiz.

Estava 2 a 0. A euforia era grande e tinha gente querendo entender que diferença fazia ganhar de 2 a 0 ou de 3 a 0. Porca miséria!!! – esbravejou o líder mafioso degraus acima. Não conseguimos entender o resto da frase, talvez o dialeto fosse mesmo siciliano. Mas entendemos que tinha que ser 3 a 0. O senhor que estava ao nosso lado já se encontrava colado ao alambrado com o dedo em riste entre o arame, apontando para o bandeirinha. Este pode ver aquela veia bem de perto agora.

Faltando 1 minuto para o fim do jogo, o Juventus consegue uma falta na entrada da área. –Adesso! Adesso! – gritava aquele senhor que revezava o xingamento ao bandeirinha com os gritos de apoio ao time. 3 a 0. Naquela cobrança de falta, a goleada estava devolvida. Tudo era festa na rua Javari. Vi um jovem com a camisa da seleção alemã abraçando um torcedor com camisa do Parma. Ouvi alguém comentando que tinha ganho o dia. Alguém disse que só faltava o Palestra ganhar à noite.

O Juventus já teve momentos memoráveis no seu estádio, na conquista desta Copa inclusive, contra o Linense. Mas a vitória daquele sábado de sol escaldante foi memorável. Memorável porque fui a mais um jogo de futebol com meu pai, porque o Juventus devolveu a goleada do primeiro turno, porque conheci o canoli juventino. Porque não fui ao cinema ou ao shopping. Porque mais uma vez o trem passou apitando lá em Campinas e a Ponte Preta sofreu um gol no final do jogo, como escutei no rádio a caminho de casa. Porque a Inter goleava o Milan por 4 a 0, como vi na TV quando cheguei em casa.

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